
Rever 2001 – uma odisseia no espaço (2001 – A space odyssey, EUA, 1968) me faz pensar na verdadeira força da imagem no cinema. Assisti ao filme pela primeira vez na década de 70, no Cine Pathé. Adolescentes têm o péssimo hábito (para os outros espectadores) de ir ao cinema em turma. Mas a minha turma era bem-comportada, formada por meus irmãos e uns três ou quatro amigos. Nosso programa era comer pizza e terminar a noite em um cinema, sessão das dez ou da meia-noite, por vezes as duas seguidas. Assistíamos ao filme compenetrados, silenciosos, amantes do cinema.
Lembro-me de um amigo dormindo tranquilamente lá pela metade de 2001. Outro insistia para sairmos do cinema, “ainda dá tempo de pegar a sessão do Palladium”.
Creio que todo cinéfilo sente o desejo de estar sozinho no cinema, de poder se entregar totalmente, sem incômodos ou interrupções, à revelação de um filme que toma conta de todos os seus sentidos até ficar para sempre na alma. Pode se passar todo o tempo do mundo e você vai se lembrar dessa sensação. Você se esquece de cenas do filme, de detalhes, de diálogos, da seqüência exata dos acontecimentos, mas vai se lembrar com nostalgia daquela noite em que assistiu ao filme pela primeira vez.
Tudo em 2001 foi assim para mim naquela noite. Entrega absoluta. As sequências lentas; a falta de diálogos durante grande parte do filme; o balé das estações, objetos e pessoas; a fotografia, a composição de cores e sentimentos que transformam cada cena em quadros que poderiam estar na parede de um museu; a voz do computador Hal.
Depois do filme, é claro, a discussão sobre a incompreensão do filme, sobre a lógica da longa e silenciosa sequência no planeta Júpiter. “E aquela cena final, alguém pode me explicar?”.
Assistindo à bela edição em DVD de 2001, que resgata a força da imagem e do som, que trouxe de volta essa sensação de entrega total ao filme, de contemplação plena, de simplesmente olhar, penso na mesma resposta de tantos anos atrás: “isso importa?”.