Nível cinco

A batalha de Okinawa foi uma das mais sangrentas do final da Segunda Guerra Mundial, agravada devido ao suícidio coletivo praticado por grande parte da população japonesa da ilha. Chris Marker se debruça sobre esse triste episódio em filme que transita entre o documentário, a ficção, a tecnologia interativa e os jogos de videogame.

Laura (Catherine Belkhodja), programadora de computador, é contratada para construir um jogo de computador tendo como tema a Batalha de Okinawa. Enquanto ela desenvolve a narrativa, uma profusão de imagens, simulando realidades interativas, invadem a tela. As entrevistas que a programadora promove, entram como depoimentos, entre eles do diretor Nagisa Oshima. 

Um momento de Nível Cinco é mais aterrador do que qualquer cena real da batalha: um padre, já idoso, narra como ele e o irmão mataram a própria mãe, atendendo aos pedidos dos militares japoneses: sacrificar as crianças e os mais velhos e depois cometer suícidio.

Uma das teorias difundidas é que as bombas de Hiroshima e Nagasaki não teriam acontecido se os militares em Okinawa tivessem aceitado os termos de rendição impostos pelos americanos. O saldo final de mortos da batalha gira em torno de 350 mil pessoas (cerca de 130 mil civis). Até quando cineastas como Chris Marker vão precisar alertar a humanidade sobre a estupidez desumana das guerras?

Nìvel cinco (Level five, França, 1997), de Chris Marker.

Constans

Após dar baixa em seu treinamento no exército, o jovem Witold consegue emprego como eletricista. No primeiro dia de trabalho, ele revela à Marius, seu chefe imediato, que tem pouca experiência na função. Marius responde que “basta ele ser honesto.” É o tema do mais famoso filme de Zanussi, ganhador do Prêmio do Júri no Festival de Cannes. 

A honestidade de Witold passa a ser confrontada por seus próprios colegas de trabalho, incluindo Marius, que exigem que o jovem faça pequenas negociações escusas no ambiente de trabalho, proporcionando lucro extra aos trabalhadores.

Em outro ambiente, um hospital, Witold também se depara com a corrupção. Sua mãe é internada devido a um câncer terminal e conseguir vaga em um quarto, assim como medicamentos, depende de “contribuições” para os funcionários do hospital. 

Constans é o retrato frio e cruel do fim do sonho comunista na Polônia. Em determinado momento, Marius pergunta a Witold: “Qual o seu preço?”, afirmando que mais dia menos dia o jovem idealista também será corrompido. Witold resiste, sua moral e ética prevalecem, talvez um ingênuo como Cândido, que infelizmente só existam na literatura e no cinema.  

Constans (Polônia, 1980), de Krzysztof Zanussi. Com Tadeusz Bradecki (Witold), Zofia Mrozowska (Mãe de Witold), Małgorzata Zajączkowska (Grażyna), Witold Pyrkosz (Marius)

Os roteiristas de Cidadão Kane

Em 1971, a crítica de cinema Pauline Kael escreveu ensaio sobre a concepção do roteiro do filme Cidadão Kane (Citizen Kane, EUA, 1941), acirrando uma polêmica: a verdadeira autoria do roteiro do filme. A ficha técnica credita o roteiro a Herman J. Mankiewicz e Orson Welles, nessa ordem. A direção, todos sabem, é de Orson Welles.

Pauline Kael defende que o argumento e o roteiro são de autoria de Herman J. Mankiewicz. Orson Welles teria apenas sugerido, por telefone ou carta, pequenas mudanças. “Orson Welles não estava por perto quando Cidadão Kane foi escrito, no início de 1940”.

A secretária de Mankiewicz que acompanhou o trabalho do autor do “primeiro ao último parágrafo… diz que Welles não escreveu (nem ditou) uma linha do roteiro de Cidadão Kane”. Era comum, nessa época, produtores e diretores assinarem argumentos e roteiros, juntamente com o escritor do filme. Isso se devia às constantes alterações que sugeriam, à liberdade que o diretor sempre teve de improvisar durante as filmagens e à prática do produtor de determinar cortes ou refilmagens de sequências inteiras. Acabavam se sentindo também donos da ideia.

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