A esposa solitária

A esposa solitária (Charulata, Índia, 1964), de Satyajit Ray.

Charulata (Madhabi Mukherjee) está tecendo um lenço para seu marido. Ela caminha pela casa. Volta ao quarto, se recosta na cama, folheia um livro. Anda pela casa novamente, percorrendo os ambientes luxuosos. Vai até a estante, pega outro livro, continua seu caminhar, agora cantarolando. Abre as persianas da janela, volta ao seu quarto e pega os binóculos duplos. Com o aparelho, observa as pessoas na rua. Tem um olhar curioso, um sorriso no rosto. Abre outra persiana e continua com seu olhar perscrutador para a rua. Se volta para a sala, observa os móveis, senta-se ao piano, faz que vai entoar algumas notas. Nesse momento, Bhupathi (Shailen Mukherjee), seu  marido, entra em cena.

Esta abertura silenciosa, narrativa visual bem ao estilo de Satyajit Ray, aponta o tema do filme. Charu é casada com um próspero e idealista jornalista, que dedica todo seu tempo ao trabalho. Ela passa os dias tentando vencer o tédio, se sentindo cada vez mais solitária na imensa casa onde reside. Tudo muda quanto Amal (Soumitra Chatterjee), jovem primo de Bhupathi, chega para passar uns dias na casa. 

O triângulo amoroso toma conta da narrativa. Amal é um jovem estudante de literatura, com pretensões de se tornar escritor. Ele dedica seu tempo em conversas e leituras com Charu, incentivando para que a jovem também escreva. A aproximação entre os dois é insinuada em gestos, trocas de olhares, versos em pedaços de papéis – a sutileza visual do grande diretor indiano. 

A longa sequência do jardim é de desejar que todo o cinema seja assim, silencioso: Charu brinca no balanço e não consegue desviar os olhos de Amal que escreve deitado na grama. O olhar de Charu oscila, junto com o balançar, entre a admiração, a descoberta, o fascínio, o amor. 

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