
A loucura de Almayer (Almayer ‘s folly, França/Bélgica, 2011), de Chantal Akerman, é uma adaptação do conto de Joseph Conrad. O filme começa com um assassinato. O chinês Chen entra em um bar, onde o jovem cantor Dain está se apresentando com um grupo de dançarinas. Ele sobe no palco e esfaqueia o cantor no coração. Todos correm, menos Nina que continua dançando como se nada tivesse acontecido.
A narrativa retrocede. O holandês Kaspar Almayer é um comerciante ambicioso que sonha em encontrar uma mina de ouro na Malásia. Vive à beira do rio com sua esposa e sua filha Nina. É a década de 50, a Malásia ainda é colônia da Inglaterra. O Capitão Lingard, explorador e amigo de Almayer, além de padrinho de Nina, chega de barco pelo rio. Contrário à vida de Nina naquele lugar, ele leva a criança à força para um internato, onde terá uma educação europeia. É o início da loucura de Almayer, que não suporta viver longe da filha e fica cada vez mais obcecado com o enriquecimento.
No entanto, o ponto de vista do filme é de Nina, que se rebela cada vez mais com o internato. Na adolescência, ela abandona a escola e começa um romance com o criminoso Dain, que vive foragido em barcos pelo rio.
“Ao verter a trama para o século XX e voltar-se os olhos para a educação e rebeldia da filha Nina em vez da loucura megalomaníaca do mercador Almayer (o que, talvez, daria num filme de Herzog), a diretora não se detém unicamente no tema civilizatório, mas desnuda um outro tópico que faz pleno sentido dentro de sua obra: a liberdade feminina, sua função crucial no processo histórico e sua potência de rebeldia. Quando sai do colégio europeu que odeia, Nina acende um cigarro como um sinal de confronto; mais adiante, ela foge dos domínios do pai com Naïn não porque ama o príncipe malaio ou porque tem um orgulho ufanista de sua raiz indígena, mas porque odeia tudo que Almayer tentou fazer por ela. No belo plano final, Almayer caminha em direção à câmera que, sábia, já conhece o desenrolar de tudo. Ao parar, ele chora por um longo tempo. Este gesto não é apenas a derrocada do processo de civilização e de catequese, mas, principalmente, de um processo que aprisiona o outro em sonhos de tesouros secretos. E é também este o projeto que criou os conflitos entre chineses e malaios armados nos momentos iniciais.” – Pedro Henrique Ferreira (Cinética).
Elenco: Almayer (Stanislas Merhar), Capitão Lingard (Marc Barbé), Aurora Marion (Nina), Zac Andianas (Dain), Sakhna Oum (Zahiira).