A carruagem de ouro

A carruagem de ouro (Le carrosse d’or, França, 1952), de Jean Renoir.

Um grupo italiano de Commedia Dell’Arte chega a uma colônia espanhola na América do Sul, no século XVIII. O grupo é surpreendido pela rusticidade do local que não tem sequer um teatro para apresentações. Camilla (Anna Magnani), estrela do grupo, se revolta com as condições, mas vai ter que vencer sua frustração pelo amor à sua arte. 

O filme é uma comédia satírica fortemente marcada pela estética, cores exuberantes, com claras referências às artes plásticas, e pela interseção entre o cinema e o teatro, entre a vida real e a ilusão provocada pelas encenações artísticas. 

Anna Magnani é o destaque da trama com sua exuberância, seu espontâneo comportamento tanto em em meio à plebe rude quanto  em meio à realeza. Assediada pela paixão de três homens, o vice-rei, um toureiro famoso e um oficial espanhol, Camilla oscila entre suas paixões pessoais, incluindo sua ambição material (o título se refere a uma carruagem de ouro que ela ganha de presente do rei) e seu amor incondicional pela interpretação, pelo teatro. Não é difícil imaginar quem vencerá, em se tratando de um papel interpretado pela majestosa Anna Magnani.

A antena

A antena (La antena, Argentina, 2007), de Esteban Sapir é uma viagem surrealista recheada de homenagens ao cinema, passando pela narrativa do cinema mudo e enveredando por ousadas experimentações estéticas com base no expressionismo alemão, no cinema noir e na animação. Tudo acontece em uma cidade sem voz, os habitantes se comunicam através de legendas visuais. Mr TV (Alejandro Urdapilleta) controla a cidade politicamente e economicamente, usando como estratégia uma televisão que está presente 24 horas na visão e mente de todos. Quando um menino que ainda mantém a capacidade de fala aparece na trama, tudo se encaminha para um thriller de suspense, com duas famílias correndo contra o tempo e contra os criminosos para difundir essa voz por meio de uma poderosa e mágica antena. 

O cineasta Esteban Sapir critica de forma contundente o consumismo, o poder totalitário que se mantém por meio de poderosos grupos de mídia. O destaque é mesmo o visual deslumbrante, a fotografia em preto e branco pontuada por efeitos especiais que homenageiam as primeiras experimentações visuais que começaram com Georges Méliès. 

O desconhecido

O desconhecido (The Stranger, EUA, 2022), de Thomas M. Wright causou impacto no Festival de Cannes em 2022, quando foi exibido na Mostra Um Certo Olhar. Baseada em uma história real, a trama acompanha um pool de agentes policiais na investigação de um suposto crime que aconteceu dez anos antes: um menino desapareceu perto de uma ponte e nunca foi encontrado. 

A escritora Kate Kyriacou escreveu o livro  The Sting, contando a saga que se tornou uma das maiores operações policiais da história da Austrália. Henry Teague (Sean Harris) é o principal suspeito. Um grupo de agentes infiltrados partilha de sua jornada, o convencendo a entrar em uma organização criminosa que “apaga” o passado de seus membros. Henry cria uma relação de amizade e confiança com Mark Frame (Joel Edgerton). 

A montagem não-linear encaminha a narrativa que tem como destaque a relação entre bandido e policial: Mark passo a passo se confronta com princípios éticos e profissionais, principalmente quando descobre o horror do crime. A interpretação de Sean Harris também merece destaque. Solitário, sombrio, o possível criminoso confunde o espectador e a polícia com sua personalidade misteriosa, frágil, talvez doentia. O típico serial killer? Um criminoso frio e dissimulado? Inocente de um crime na verdade nunca esclarecido?