São Paulo, sociedade anônima

São Paulo, sociedade anônima (Brasil, 1965), de Luiz Sérgio Person.

O diretor Luiz Sérgio Person foi uma espécie de representante isolado do cinema novo em São Paulo. O cinema novo se consolidou com a filmografia de dois grupos de cineastas, baianos e cariocas, que se juntaram na cidade maravilhosa refletindo, debatendo e praticando um cinema contestador, revolucionário, sempre centrando suas histórias na Bahia e no Rio de Janeiro. 

“São Paulo S/A possui a particularidade de se inserir no rodamoinho temático e existencial que atinge o novo cinema brasileiro no pós-1964. Dialoga de modo frontal com esse contexto, mesmo situando-se na exterioridade do grupo cinemanovista. Luiz Sérgio Person tem a origem de sua carreira nos quadros que sobreviveram isolados ao desmonte dos grandes estúdios como Mojica e Candeias.” – Fernão Pessoa Ramos. 

São Paulo, sociedade anônima tem como protagonista Carlos (Walmor Chagas), um jovem funcionário de uma fabrica de auto-peças para o mercado automobilístico.  Ele é casado com Luciana (Eva Wilma), jovem da classe média emergente paulistana, mas mantém casos amorosos com outras duas mulheres: Ana (Darlene Glória), uma ambiciosa jovem disposta a subir na vida, e Hilda (Ana Esmeralda), uma intelectual amargurada que acaba cometendo suicídio. 

A cidade de São Paulo é a personagem que move todas as engrenagens, não só desses relacionamentos, mas da sociedade que vive em constantes conflitos, motivados pelo progresso caótico cujo maior representante é a indústria automobilística. Carlos se vê cada vez mais sufocado pelas cobranças de se projetar social e economicamente, impelido até mesmo a se tornar sócio de seu chefe, que usa dos artifícios inerentes à corrupção para fazer bons negócios com as montadoras de automóveis. 

“O protagonista Carlos tem consciência social da exploração e da miséria, mas não é isso que o atormenta ou o move. A bruma do vazio está mais embaixo. Ela reduz a velocidade do seu ser no mundo, fixando-a ao espectro da melancolia em meio a uma metrópole pujante que vibra. A inutilidade e o desinteresse tudo empastela, até desembocar na inutilidade da vida e no horizonte do suicídio.” – Fernão Pessoa Ramos. 

A narrativa segue a jornada de Carlos de forma fragmentada, usando os seus relacionamentos com as três mulheres como se fossem episódios que se interligam. Nos intervalos destes encontros, Carlos vaga errante pela cidade abarrotada de pessoas e veículos, todos correndo alucinados, apavorados, mas sedentos, diante do progresso mais veloz do que todos.  

“É o espírito caótico e devorador da cidade que o roteiro soube captar, mostrando com crueza o que ela oferece e o que cobre de volta, o preço humano da industrialização e da mecanização da vida e das relações sociais. Tem ainda momentos clássicos e que resistiram ao tempo: a silhueta de Ana diante da imagem da cidade, o começo em que o casal dialoga em lugares diferentes, a visita a mãe com clima felliniano.” – Rubens Ewald Filho

Referências:

100 melhores filmes brasileiros. Paulo Henrique Silva (org.). Belo Horizonte: Letramento, 2016. 

Nova história do cinema brasileiro. Volume 2. Fernão Pessoa Ramos e Sheila Schvarzman (organização). São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2018